Ou, pelo menos para nós, trata-se de uma hiper-curiosidade!
Há 2-3 anos, prosseguindo nas nossas pesquisas do doutoramento encontrámos num Tratado de Arquitectura as mesmas malhas que os alunos do IADE (afanosamente) desenhavam no antigo primeiro ano*.
E de imediato logo nos ocorreu uma pergunta? Quem terá sido o professor que introduziu aquela matéria e temática nos programas do curso, no início do 1º ano da disciplina de desenho técnico?
Mas mesmo sem qualquer indício de resposta, admitimos que tivesse sido Manuel Lapa ou, talvez mais, da autoria de Lima de Freitas?
Fosse como fosse, certo é que para os alunos era por vezes quase um martírio conseguir desenhar essas malhas sem fazer erros. Porque logo desde o início do trabalho, qualquer falha seria ampliada quando estendessem os seus traços para o lado direito e inferior das folhas de desenho. Era preciso imenso cuidado e muita disciplina para conseguir estender os desenhos (i. e., prolongar os traços) a toda uma folha A3**. Como se pode ler no texto e imagens seguintes do enunciado de um exercício escolar do final dos anos 70, que há dias encontrámos (em «arrumações»).
A curiosidade - e para nós não é pequena (por haver coincidência) – está no facto de serem praticamente os mesmos padrões que constam no referido Tratado de Félibien como sendo os mais adequados (pelas figuras geométricas-base de que partiam) para serem usados nas vidraças das janelas.
"Verreries" que eram atravessadas pela Luz, a mesma que há milénios tinha um sentido divinizante, como várias vezes temos escrito.
*Ainda antes dos anos 1980. É o Tratado de André Félibien (de 1690, como está na capa) ao qual pode aceder por aqui - no PDF ver as pp. 268 a 275. E os desenhos que lhes correspondem estão nas pranchas: XXXIX (39) a XLII (42). Que acima têm um número de página diferente, mas são as mesmas imagens
**Note-se que esse trabalho há muito foi retirado do currículo escolar embora tivesse algumas vantagens: domínio e rapidez no uso de vários materiais e instrumentos de desenho (em papel, e não no computador como hoje se faz); conhecimento das propriedades das figuras geométricas, que alguns exercícios posteriores (depois das malhas já estarem desenhadas) permitiam aprofundar.
Esta coincidência iconológica não nos parece que seja um mero acaso, merecendo ser muito mais desenvolvida, por, aparentemente, corresponder a uma evolução, e também a uma decadência (mas ainda patente e observável no final dos anos 70 do século XX) do que foram temas e assuntos que, durante séculos, se transmitiam aos praticantes de uma arte ou profissão.