Na imagem seguinte, capa de um livro cujo título - Symbols of Power - nos diz imenso*, está um excerto de uma obra de Ingres. À qual se pode aceder, inteira, indo por aqui
Desde 2002 a 2004, ao estudarmos Monserrate, e face às condições tão particulares do nosso trabalho, em que «recebemos» um briefing que obrigava, forçosamente, a um percurso pelas Origens do Gótico**; desde essa data percebemos que os mesmos sinais (e não símbolos como se explica na primeira nota abaixo) serviram para desenhar a Arquitectura. Isto é, esses mesmíssimos desenhos também eram usados nos trajes reais, ou nos dos príncipes e nos dos nobres.
E, claramente, válido também no feminino, para rainhas, princesas, etc.
São por isso fabulosas, por exemplo, algumas das indumentárias visuais que se descobrem em retratos como o de D. Sebastião, num retrato de D. Maria I; em vários de Isabel I de Inglaterra, num do Vice-Rei D. João de Castro, no da Princesa Santa Joana, etc., etc., etc. ...
Por nós, precisamos de os estar a ver, para os ir descobrindo (ou lendo), passo a passo, nas suas reuniões, ou nos somatórios de sinais que foram feitos; e desse modo constituíram aquilo a que alguns chamam "retratos áulicos".
E esses somatórios conseguem então «fabricar», visualmente, toda uma ênfase que é, pode-se talvez dizer (?), uma Simbologia do Poder.
Mais uma vez, e porque temos bastantes informações sobre este tema, fazemos um esforço de contenção. Sendo do nosso trabalho Monserrate - uma Nova História***, da p. 183, que sai hoje (e inteirinha, como podem confirmar) a nota nº 279.
Acrescentando apenas, que os sublinhados a amarelo, correspondem àquilo de que nos lembramos, de imediato, sempre que folheamos ou percorremos, visualmente, diferentes exemplos; sobretudo os de um livro como este:
"Talvez William Beckford tenha contactado a Mandorla, em Portugal, onde por exemplo esta forma, ou os arcos de círculo que a constituem, são muito frequentes, em vãos e varandas da arquitectura tradicional, em especial no Norte do país. Mas a associação em obras classizantes, de formas de raiz simbólico-teológica, já existia no Barroco; Fernandes Pereira, como mostrámos no capítulo anterior, fundamenta esta característica. Mas também Paulo VARELA GOMES, em Traços de Pré-Romantismo na Teoria e na Prática Arquitectónica em Portugal na Segunda Metade do Século XVIII, mostra como a região do Porto (por influência Inglesa, ou de Nasoni, ou o facto do terramoto de Lisboa ter destruído sinais mais antigos?), a zona Norte mais do que a de Lisboa, reúne um número importante de casos, onde se inclui vocabulário vindo do Gótico, como mostra o autor. Ainda no artigo que estamos a acompanhar, refere obras no Convento do Carmo a partir de 1757: “...em que os frades quiseram reerguer o templo gótico sabendo muito pouco dessa «maneira»...”. Op. cit., p. 235. Neste artigo faz alusão à fundamentação teórica da arquitectura em Portugal, na época, por Cirilo W. Machado, de quem retira várias frases. Mas Paulo Varela Gomes, não notou a importância que têm, outras informações de Cirillo, quando refere: diademas e coroas, círculos “de luz como os santos...” (ver em Cirilo Wolkmar MACHADO, Tratado de Arquitectura & Pintura, F. C. Gulbenkian, Lisboa 2002, p. 218); e ainda por exemplo, toda “a panóplia” de insígnias, vestidos, escudos, etc., de “Fenicios, Syrios e Macedónios...” (idem op. cit., p. 220). Não notou que a arquitectura medieval se marcava, tal como as pessoas punham na sua “indumentária visual”, com atributos, que permitiam que se distinguisse. E essa marca na arquitectura, fazia-se com elementos muito simples, que foram depois trabalhados e se complexificaram. Segundo pensamos, Cirillo escreveu sobre esses elementos: “...Os homens começarão no oriente a fazer imagens que erão como nomes ou ieroglifos...”(idem, op. cit., p. 254). E depois escreve já sobre o Gótico – “...e fabricarão sem ordem, chamouse architectura Gotica por ser de Godos(...) fazendo templos só com regras mecanicas de fabricar...” (idem, op. cit., p. 266). Sublinhado nosso, para evidenciar o que por vezes “sentimos”, perante algumas obras. Não a preocupação de obediência a um estilo, mas o uso de “regras de construção” (a que o autor chamou “mecânicas de fabricar”)."
Por fim, em nossa opinião (e por isso ficou no texto), impunha-se fazer uma alusão à expressão de Cirillo relativa às regras “mecânicas de fabricar”. Pois como pude aperceber-me, de 2001 até 2005 (período em que estive na Faculdade de Letras) aí a percepção do que é a construção, a arquitectura, os estilos, o carácter monumental/patrimonial de certas edificações; tudo isso é concebido, ou percepcionado (foi como o sentimos!), tão longe do real, das massas e da força da gravidade (como se fosse uma imensa abstracção...). E de tal modo, que a expressão "regras mecanicas de fabricar", sem dúvida, também a ele, e já no século XIX, se lhe impôs como uma necessidade.
Embora o diga (e isto pode parecer contraditório da nossa parte, pois Cirillo escreveu-o a defender o estilo gótico) a propósito de "as extravagancias Goticas, que são Tedescas;..."
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* Diz imenso o conteúdo, mas não concordamos, totalmente, com o título. Por termos percebido, há muito, que os Símbolos não são forçosamente o mesmo que Imagens (visuais). No cristianismo inicial o Símbolo dos Apóstolos foi substituído, a partir de 325, pelo chamado Símbolo de Niceia. E mais tarde, depois do Concílio de Constantinopla, o referido Símbolo de Niceia passou a ser, como se chama (agora e é o Credo): Símbolo Niceno-Constantinopolitano. Donde, inicialmente, um Símbolo é uma reunião de ideias.
Ora neste caso dos Símbolos da Fé, a estes, que eram reuniões de palavras, posteriormente associaram-se (automática ou convencionalmente) imagens. As mesmas que passaram às igrejas e aos objectos litúrgicos, e que depois Reis, Imperadores e todos os outros poderosos, resolveram também plasmar nas suas vestes. Como sinal da sua adesão às religiões (que tinham sido tornadas oficiais).
**Sobre a questão das Origens do Gótico procurem em bibliografia de Maria João Baptista Neto, e depois nos nossos posts, onde não faltam referências a esta temática que nos fez abordar; e donde não pára (felizmente) de continuar a sair material, fantástico e muitíssimo inovador.
*** Monserrate - uma Nova História, por Glória Azevedo Coutinho, Livros Horizonte, Lisboa 2008.
O livro Symbols of Power, é de Paola Rapelli, traduzido por Jay Hyams. Edição de The J. Paul Getty Museum, Getty Publications, Los Angeles 2011.