... até lá atrás, à Corte de Justiniano (no séc. VI d.C.), ou à de Constantino o Grande (no séc. IV d.C.), todos sabemos que as sociedades, e portanto a política, mudou de mais:
A ponto de muitos fenómenos não serem agora compreendidos, nem sequer aceites...
Assim não admira - mas nada mesmo... -, que na actualidade, ninguém perceba HISTÓRIA DA ARTE (sobretudo o que se pode encontrar numa investigação, minimamente organizada!).
Concretamente o que foi a Arte mais antiga; ou como muitas das imagens do que hoje em geral chamamos Arte, foram produzidas ao serviço da política, em sociedades que eram teocracias.
Portanto, dizendo de outro modo, muitas dessas imagens antigas foram criadas também para servir a religião e a liturgia**. Particularmente, muitas delas estiveram ao serviço de grandes valores, ou de grandes ideias, como era a ideia de Deus, do qual emanava o Poder.
No nosso trabalho dedicado a Monserrate*** integrámos imagens que, pelos menos os arquitectos - por pensarem com lógicas da geometria -, facilmente reconhecem a sua semelhança com o que está em diferentes artes visuais, incluindo a arquitectura.
É o caso da Fig. 96 (ver nota) publicada inicialmente na História de Portugal de José Mattoso. A figura reúne marcas e sêlos rodados dos nossos primeiros reis, e onde vemos, nos sinais com o número 12 e 14 as mesmas intersecções de círculos que estão nos "cullots" da imagética cisterciense. Mas essas imagens foram também a cruz pátea, ou, passaram ainda às auras dos santos.
Já nos sinais com o número 15, embora muito reduzidos, vêem-se os escudos que derivaram, como defendemos, da forma que é designada mandorla mística
O que é interessante observar é a passagem alternada, que se verifica, entre formas da natureza (por exemplo as amêndoas), e as formas puras, abstractas, vindas da Geometria e até do Alfabeto. Como é o XP, chamado Qui-Ró (letras do alfabeto grego), no escudo dos soldados. Ver acima no mosaico de Ravenna, que representou a Corte de Justiniano.
Uma imagem que, sempre que a vejo, me lembra D. Afonso Henriques e a Lenda do Milagre de Ourique, ou ainda, e simultaneamente, o episódio - também considerado milagroso -, ocorrido com Constantino, na batalha chamada da Ponte Milvius que ganhou contra Maxêncio.
A História tem sido assim, em que alguns episódios ocorridos com chefes e reis célebres, transitaram mais tarde (vários séculos depois), e dada a fama dos primeiros protagonistas, para a vida de outros: também eles vistos como Grandes, Fundadores e/ou Magnânimos.
É muito fácil perceber que as gerações de hoje (ou desde há cerca de 20-30 anos...), que receberam muito menos informação; ou a quem não foram incutidos, por exemplo, valores que eram tradição da cultura europeia desde há 5, há 8 ou há 9 séculos, não consigam entender as lógicas daquilo a que se está a chamar Arte.
Muito mudou, e se nalguns casos a Arte, as Mentalidades e a Política ainda podem ser relacionadas, no entanto, um fio condutor que por vezes em História ainda se estabelece (e se quer ver), está todo ele emaranhado e cheio de nós, tornando dificílima a percepção de alguma continuidade...
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*Miguel Sousa Tavares em 26.05.2019
**Que é a administração da Pólis, ou a Cidade.
*** Ver em Monserrate uma Nova História, por Glória Azevedo Coutinho, Livros Horizonte, Lisboa 2008, p. 265.