Como nos aconteceu ao estudar Monserrate, deparámo-nos com ideias arreigadas e pré-concebidas: de quem escreveu sem ter ido ver.
Tal e qual o que é típico de uma certa «historiografia» (manhosa) cá do sítio - que se apressa a criticar quem tem olhos - e mais ainda quando esses olhos, depois de ligados ao cérebro, pelo nervo óptico, estabelecem conexões sinápticas. Ou seja, quando ligam memórias armazenadas na mente, e as confrontam, com o que lhes é dado ver em cada instante.
Pior ainda, tirando depois conclusões daquilo que os olhos viram. O que em Portugal, especialmente na FLUL é crime
Assim, importa dizer o que já se passava na nossa Black Box, bem antes de chegarmos à FLUL:
É que nós já tínhamos estado em Brighton, e já tínhamos percebido como Monserrate, arquitectonicamente, era bastante mais «bem comportado» do que o pavilhão de Brighton: mais contido, e muitíssimo mais sóbrio.
Podendo até analisar-se (acrescentamos agora) numa perspectiva semiológica. Ou seja, à maneira dos estilos históricos (sobretudo os da Idade Média).
Pode-se observar, concretamente, o estilo decorativo que os arquitectos Knowles criaram/inventaram para a casa de Francis Cook. E ainda como o usaram - criando uma ordem arquitectónica, talvez única? Tal como é explicado por E. H. Gombrich neste seu título, cuja capa está aqui:
Mas, não nos dispersando mais, voltamos às frases de J.-A. França sobre as origens da solução arquitectónica que está em Monserrate. Frases que, ainda nos princípios deste século, iam fazendo o seu caminho, livre, e acriticamente, nas mentes adormecidas de quem sempre lhe bastou, citar, e citar, e citar; e continuar a citar... O que é afinal - quando nada se avança? - igualzinho a copiar.
Ou a «encher de palha», como dizíamos aos alunos.
Só que agora (deve ser castigo?), lá temos nós que ir copiar - mas é por uma boa razão - o que J.-A. França escreveu:
"O orientalismo de Monserrate define-se, porém, por nítidas raízes inglesas, que podem ser procuradas no famoso pavilhão de Brighton, de Nash, construído entre 1815 e 1823 (...) A grande torre circular, fulcro da composição de Monserrate, vem possivelmente do palácio inglês, embora os quarenta anos que o distanciam do risco de Nash permitam ao palácio de Cook-Knowles um sentido cenográfico algo diferente,..." *
Ora, como está no nosso estudo - na medida do possível posto passo-a-passo (e não assim numa frase) -, a casa de Monserrate, com projecto do atelier dos arquitectos James Thomas Knowles - o pai e o filho tinham o mesmo nome -, correspondeu a um aproveitamento (original e bastante criativo) da base já existente no terreno de Sintra. Acresce que os desenhos estão aí, e provam-no, em que o fulcro da composição, ao contrário do que França escreveu, era, nitidamente, muito mais cúbico do que circular...?
Base que terá sido obra de Gérard De Visme, e na qual William Beckford - de acordo com vários testemunhos - passou algumas temporadas: Meses ou anos?, não sabemos...
O que sabemos, e no futuro - provavelmente vai-se saber sempre cada vez mais** -, é que o Pavilhão de Brighton, por sua vez, também este não foi uma obra feita a partir de um único projecto, de John Nash (1752-1835):
Antes, cerca de 1787, houve uma versão de Henry Holland, muito menos orientalizante, já que este arquitecto «seguia» Robert Adam e o neo-clacissismo francês . Tendo havido ainda depois, a preceder a intervenção (final) de J. Nash, uma campanha de obras da autoria de William Porden. Foi este que desenhou os Estábulos, com cunho indiano - em 1803***.
E só em 1815 é que John Nash foi então chamado para fazer um trabalho que, se tem muito de «criação e novidade», é também o da junção e o da integração de partes que estavam desligadas, mais aquilo que ele mesmo - grande criativo e inventor - lhe veio a acrescentar.
Contada esta história que está no nosso livro (nota***), também lá se registou a ideia do palacete de Sintra, que pertenceu a Francis Cook, ter sido um retrato da globalização do século XIX: contemporânea da Rainha Vitória.
E a História que alguns andam agora a querer apagar, e/ou a re-escrever, será sempre recontada. Naturalmente pelos que vivem em sociedades estabilizadas, e onde o que é básico já está garantido.
E onde por isso mesmo é permitido aos cidadãos contactarem novos conhecimentos, fontes e informações que podem compaginar, face às novas ciências. Para entenderem melhor o caminho que fizemos - enquanto Humanidade - para chegar até aqui (como há dias se lembrou). Pois é este o maior interesse da História
É portanto por tudo o que está acima, dito e redito (em trabalhos nossos - já que, sobre este assunto não nos chegaram outras, ou novas, informações), que também para nós é fascinante re-encontrar o Pavilhão Real de Brighton
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* Ver em J.-A. França, A Arte em Portugal no Século XIX, Primeiro volume, Livraria Bertrand, Lisboa 1967, p. 373. Note-se que o extracto que citamos tem várias incorrecções...
** Porque cada vez há mais estudos detalhados, resultado do muito mais que se tem podido investigar em algumas universidades.
*** E em Monserrate uma Nova História, podem ver a semelhança que lemos entre esses estábulos e a Sala da Música (existente no palacete de Sintra)