CONTINUANDO A VIVER EM TERRA DE CEGOS, felizmente aprendemos, e damos espaço aos que ensinam a ver.
Neste caso a André Grabar, que foi dos que mais nos ensinou, através dos seus livros.
Por isso já escrevemos vários posts em que o mencionámos. A ver em Primaluce.blogs.sapo e também em Iconoteologia.blogs.sapo.
Sendo o excerto que se colocou no fim (de propósito), talvez, um dos que já citámos mais vezes, por evidenciar como o circulo foi adoptado para representar Deus.
Embora nem sempre, seja exemplificado e explicado, com algum detalhe, o modo como isso aconteceu. É o que tentamos fazer no post de hoje e seguintes.
Claro que se o círculo estiver acompanhado de outras formas (desenhos e representações, porventura icónicas), e não for apenas uma formulação, esquemática, abstracto-geométrica, assim será mais fácil perceber que o círculo foi usado em representação de Deus; ou até de outras entidades, que no cristianismo são consideradas divinas*.
Como acontece nas imagens seguintes - que em geral todos consideram serem representativas do Sol, e onde existem ornamentos e outros desenhos (icónicos), que complementam o círculo; ou ainda, inscritos nele, e dele irradiando, traços ondulantes - como muitas vezes fazem as crianças - na tentativa de desenharem raios de luz, vindos do sol.
(ampliar - azulejos do Palácio de Santos, onde é actualmente a Embaixada de França. Foto proveniente de livro - por Hélder Carita)
Na imagem acima, desenho nosso, feito a partir da representação do Sol Invictus na fachada da Igreja de Santa Maria Novella de Florença **. Sendo que na ampliação (a seguir), é mais visível que a preceder os raios, do centro para a periferia, há um anel, ou círculo desenhado, notoriamente marcado.
Tal como no fim (vendo do centro para a periferia), as duas imagens - a do palácio de Santos e a da igreja de Florença - reúnem vários círculos concêntricos, o que é impossível não ver como «ênfases visuais»
A partir daqui, e considerando aceite a ideia de que o círculo (e a esfera) foram usados para representar Deus e outras figuras celestes, vamos observar através de vários exemplos - imagens que temos recolhido e desenhado. E como é que formas básicas da geometria foram associadas; a ponto de criarem conjuntos de formas, que alguns viram como sendo semelhantes a moléculas ***.
Daí a expressão empregue por André Grabar, que lhes chamou "formules stéréochimiques". No exemplo seguinte, em nossa opinião, o entrelaçamento feito entre círculos maiores e menores, já terá pretendido ser, uma representação visual do Filioque, na Arte Romana (tardia). Vê-se em pavimentos romanos, de mosaicos, mas é um motivo que persiste a ponto de se encontrar (depois) em obras da Idade Média.
Por exemplo na Arquitectura Românica como já se escreu há 14 anos (e se aconselha a ler)
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Curiosamente, no nosso trabalho dedicado a Monserrate consta uma passagem de André Grabar (ler na p. 40 de Monserrate, uma Nova História, Livros Horizonte, Lisboa 2008) relativa às representações do Espírito Santo.
Como temos vindo a defender há (sobretudo houve, embora desconhecidas da maioria...) várias outras representações. Que não apenas a Pomba, ou as Línguas de Fogo, que são muito mais percebidas e conhecidas (mas julgadas únicas, ou exclusivas, como representação do Espírito Santo)
E foi André Grabar, ele que questionou a representação do Filioque, quem melhor explicou - de acordo com a nossa opinião (e os livros em que estudámos) - o processo de elaboração da Iconografia Cristã que vamos continuar a expor.
Concretamente, escreveu sobre as imagens criadas, a fazer lembrar moléculas ou fórmulas químicas, como está no excerto seguinte.
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* Como Nossa Senhora, os Santos, os Anjos etc., etc.
** Claro que nos questionaremos sempre, sobre a razão de Léon Battista Alberti para colocar uma imagem do SOL INVICTUS, tão visível, na fachada de uma igreja católica.
*** Representações que têm origem no mundo físico - nas Ciências da Natureza e na Astronomia, devendo lembrar-se também Demócrito, e a sua concepção (ou a invenção) do Átomo