Arquitectura, Artes Decorativas, Design.
Quando é que a Arquitectura, ou as designadas «Artes Decorativas», que tantas vezes a complementam, não como equipamento e mobiliário solto, mas como elementos integrados e plasmados (built in - dizem os ingleses) na construção; quando é que esses elementos se soltaram e ganharam autonomia?
Mas, tentando mais clareza, pode-se pôr a questão de outra maneira: foi a Arquitectura que influenciou essas «Artes Menores», ou ao contrário, foram essas Artes como «objectos soltos» que passaram a influenciar a Arquitectura?
Esta é sim uma eterna questão, porque vem de muito longe.
Em nossa opinião, como nos exemplos que estão abaixo (um tecto, trabalho naturalista de Domingos Meira, e duas peças de loiça da Fábrica Bordalo Pinheiro) os estuques decorativos - plasmados na construção - um dia autonomizaram-se e ganharam um estatuto próprio, passando a objectos; se bem que quase contemporâneos dessas edificações, mas independentes delas.
No entanto, esse processo - das formas arquitectónicas influenciarem (aparentemente) os cenários extra-construção e os objectos que os formam, tal processo vinha já de trás; e dizemos que vinha de há um ou dois milénios antes, a ideia de que a Decoração (ler a explicação de 'Décor' dada por M. J. Maciel) era uma ênfase, concomitante com a ideia de adequação e conveniência, do vocabulário que também já estava na Arquitectura.
Assim, dizemos que só nesse sentido enfático (indo à Etimologia e ao vernáculo), é que faz sentido usar a designação Artes Decorativas. Ou, tentando exprimir melhor: as formas - e em geral estamos a referir as geométricas e as que são consideradas abstractas - constituíram uma linguagem: verdadeira linguagem que era disposta (ou composta e aglutinada, feita imagens e novos sintagmas visuais*) e que desse modo se distribuía por diferentes superfícies da construção, em sucessivas e repetidas afirmações, quase sempre, das mesmíssimas ideias.
Que eram a afirmação da Fé na Trindade Divina. Ou, que poderíamos também dizer, essas formas e as suas combinações (mais ou menos sintagmáticas, ou, com o tempo e depois de estabilizadas e aceites apenas paradigmáticas**) eram uma das muitas possíveis proclamações visuais do "Credo in unum Deum...: habitualmente mais conhecido como Símbolo de Niceia-Constantinopla.
Nesta nossa opinião (e imensas explicações inerentes, que são necessárias) está aqui muita informação, não destrinçada como hoje se tornou regra essencial fazer. Porém, não a fazendo pela imensidão do tema e falta de espaço, seria a partir dela, que mais uma vez insistiríamos em sucessivas e muitas outras explicações (e desdobramentos de ideias) que assim permitem compreender o passado e as evoluções que a Arte fez.
Não terminando ainda, lembra-se a capa de um livro de Gombrich que explica um pouco as Artes Decorativas, como as compreendeu, e como em geral (em nossa opinião) funcionaram quer no século XIX, quer durante o século XX. No entanto, e apesar do muito que em geral todos devemos a este autor, para a compreensão da Arte mais antiga, por isso mesmo não podemos estar de acordo com o sentido que viu nessas Artes Decorativas, e o referiu no dito livro.
Insiste-se, - sejam ou não primeiras luzes nesta temática? - o que hoje alguns chamam e vêem como Artes Decorativas, inicialmente foi uma língua: cujos vocábulos mudavam de escala, deixando de ser arco, ou suporte da construção para serem algo comparável a vários (ou um único) post-it.
Qual alfiz adjectivador (o dito post-it) colocado sobre uma porta, que assim indicava quem passasse sob essa mesma porta. Ou, qual tímpano de Arco Quebrado, ou as bandeiras (no século XVIII em forma de leque - fan door) e as vergas de portas, como as explicou já no século V-VI, o Pseudo-Dionísio, o Areopagita***.
A terminar, sabemos que hoje (cada vez mais) todos separam tudo, e que assim perderam a noção da história de muitos elementos estilísticos. E neste caso também a passagem para o Design, porque já o é, de peças que se inspiram nas formas colocadas (inscritas, moldadas) na arquitectura. Ou, indo mais longe, que aproveitaram para a moldagem do caulino, as mesmas técnicas que foram usadas (ou estavam ainda a ser desenvolvidas) na moldagem do gesso.
Claro que este post é dedicado aos nossos orientadores de estudos pós-graduados, e também às instituições onde estão e se faz essa investigação (mestrados e doutoramentos) relativa à história dos estudos artísticos e à «formação» das chamadas escolas industriais. Aqui, pelo link, ler o que está na p. 27, e também as várias disciplinas que eram leccionadas, para se confirmar como na actualidade foram banidos conhecimentos que são essenciais, de cultura geral: Mas essa é já uma mensagem para outros, que não sabem qual é o papel do design, que em português se traduz (simplesmente) por projecto.
*Nos casos das obras mais criativas
**De quem teve que estudar e «tentar compreender» Semiologia nos longínquos anos de 1973-74
***Uma das melhores provas de que se faziam correspondências linguísticas ou de ideias (e assim atribuíam significados), às formas que se colocavam nas edificações. Num excerto que não nos cansaremos nunca de apresentar: