Muitos falam, falam, falam, e repetem, quase doentiamente, a palavra e o tema da Criatividade - como algo que lhes faltasse. Claro! Não admira
Aqui, e desde já encurtando imensas razões, ou todas as justificações, lembre-se que há quem ache que ela (a Creativity) é a solução para todos os futuros. Como se só houvesse amanhã se o mesmo fosse novo, em inglês, e nunca um "déjà vu"...
Idem, porque claro que estamos a escrever sobre gente que por tudo e por nada alude a «novos paradigmas». É isso que eles buscam, esquecendo-se que esses «novos paradigmas»*, em geral serão muito mais pobres do que se fossem «novos sintagmas». Enfim, que são os sintagmas (ou as novas e as primeiras sínteses) que exigem uma criatividade permanente: a que estará em cada mente, como Umberto Eco explicou.
[Chama-se Cultura - e por isso este link para um exemplo de quem sentiu o mesmo, numa situação muito concreta: de algo que podia ser muito mais e se ficou por muito pouco]
Terminado o parêntesis, segue-se adiante:
Pois percebe-se que os materialistas (do ter, que esquecem o ser) eles anseiam desesperadamente por possuir uma criatividade objectiva, muito concreta e palpável, como se a pudessem agarrar e fechar na mão para sempre; esquecem-se que alguns dos mais criativos que podemos conhecer, não são de hoje, já foram: já existiram e deixaram sementes (muitas) por aí dispersas. Vindas de Autores que foram seminais.
De sementes tão espalhadas que podem ainda agora constituir, por exemplo, cerca de 1500 anos depois, aquilo que em geral se reconhece como o Inconsciente Colectivo.
Por nós, e dos (poucos) estudos que temos feito**, pusemos no mesmo degrau (mais alto) duas figuras que foram quase contemporâneas: Santo Agostinho, e um outro autor de quem pouco se conhece, e ficou designado como Pseudo-Dionísio, o Areopagita.
Dos dois qual terá sido o mais criativo? Francamente inclinamo-nos muito mais para aquele que os franceses chamam Augustin. No entanto, lendo os Escritos do dito Areopagita – e já lemos muito nas traduções de Maurice Gandillac -, desses escritos aos quais acedemos em francês, é impossível não se ficar totalmente fascinado com muito do que reúnem (e aquilo que explicam da Iconografia Cristã).
Claro que, e havendo a oportunidade de conhecer mais, então pode-se começar a perceber que provavelmente se tratam de informações que recolheu ou «bebeu» noutros. Talvez até numa tradição anterior (popular?), difundida pelo médio Oriente e com antecedentes na Cultura Hebraica. Ou ainda mais para trás, vinda da Cultura Persa?
Seja como for, na obra do Pseudo-Dionísio, o Areopagita, parece – a nós parece-nos - estar reunido (no que terá sido um novo paradigma...) aquilo que já vinha de trás, já existia e conhecia, e então organizou. Surgindo uma pergunta: será que foi organizado de outra maneira?
Não sabemos...
Diferentemente – se bem que tenhamos lido muito menos da obra de Augustin (autor que é anterior) - alguns dos seus textos parecem explicações feitas quase ao vivo; as de quem pretende comunicar ao leitor aquilo que está a combinar (imaginar) mentalmente, de uma forma até então nunca vista ou apresentada. Como se nos mostrasse as «suas» imagens interiores (produto da sua capacidade de criar imagens***): as que no seu cérebro o foram ajudando – ao mesmo tempo que escrevia – a produzir e a apresentar a ideia que agora, em qualquer momento, qualquer um pode ir ler. Estas parecem ser construções muito criativas, e, verdadeiramente sintagmáticas.
Mais, parece-nos que a criatividade é isto: o que alguns podem chamar “centelha de divino”; mas que acima de tudo vemos como inteligência e vivacidade. Uma capacidade em que alguns (ou todos) têm de se ir adaptando ao(s) caminho(s), mesmo que esse seja só mental. Fisicamente é como andar sobre pedras, onde nem há caminho: ir pondo o pé, o direito e o esquerdo, alternadamente, de modo a que cada movimento, seja um avanço:
Verdadeiro avanço mental, tal como aquele que um chamado "dataflow diagram" (depois de desenhado) também permite fazer.
Quando se percebe que os chamados Estilos - como assim são designados pela Historiografia da Arte, que nasceram sobretudo de processos como estes (o que se pode verificar durante cerca de 2000 anos); então é quando se realiza que esses mesmos Estilos são quase como imagens interiores - e portanto considerados hoje 'aide-mémoire': i. e., uma iconografia feita de imagens mnemotécnicas.
E que a Criatividade de que todos falam, quase doentiamente - essa «de apanhar na palma da mão, e manter muito agarrada e guardada num punho fechado»; então é que se percebe que ela é demasiado material, datada e sem chama:
Que é uma Criatividade (paupérrima), a lembrar átomos que não tivessem «valências» (ou a capacidade de fazerem ligações químicas): i. e., uma capacidade que pode ser fonte de enormes rendimentos, por isso pesquisada, e cada vez mais essencial.
Aliás, recordamo-lo, na Indústria Química ou Farmacêutica a constituição de novas moléculas é, actualmente, o melhor exemplo de uma verdadeira criatividade. Quiçá o mais puro dos Sintagmas****?
Origins, Meaning and Evolution of Artistic Styles Ver em - http://areas.fba.ul.pt/fh/CIEBA.pdf
(clic na imagem para legenda)
*Novos paradigmas que, mal surgem são exauridos e esgotados à saciedade, e «à exaustão»! De tal maneira que, logo que nascem, logo outros são necessários! É uma canseira, pobres coitados, pois ninguém se dá ao seu próprio luxo de gozar o bom ou a beleza do que criou.
**Visto que há muito, muito mais...
***Que sejam explicativas de uma realidade difícil de entender, e não propriamente daquilo que muitos tendem a considerar como uma imaginação prodigiosa. Isto porque sabemos que de uma imaginação prodigiosa se pode tender a deslizar para a fantasia; assim, para terminar lembre-se que imaginação e fantasia são coisas bem diferentes.
****O que nos lembra aquele Prof. que devia ter ensinado mais Teoria de Arquitectura, e que, talvez sabendo das muitas lacunas, falou imenso de F. de Saussure, de Linguística e de Semiologia.
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