Exigente, porque a maioria dos autores fez para si, ou adoptou como regra – o que comummente era escrito e dito sobre os estilos – de uma maneira totalmente hermética. Isto é, completamente fechada, ao contrário do sentido de «obra aberta» de que Umberto Eco tem escrito e divulgado.
Quando Sandra Costa Saldanha cita as palavras seguintes de Armando de Lucena, sobre a Basílica da Estrela, nelas transparece o preconceito da época (1946), que em Portugal, e no caso da maioria dos estudiosos ainda se mantém muito vivo, relativamente aos estilos arquitectónicos:
“…em estilo novi-clássico, degenerado por abuso e certas liberdades de forma que lhe deram características especiais, estilo, por alguns também chamado joanino [que] melhor se chamaria barroco”.**
Segundo lemos e nos podemos aperceber, em geral os autores e estudiosos das obras de arte, mantêm-se ainda fixados numa ideia – muito «fechada e terminada» – na qual, para si, praticamente, os estilos não admitem variantes.
Não vêem que na sua base estiveram Ideogramas (em geral consignados desde a época paleocristã) – imagens, diagramas e esquemas – que se podiam usar com razoável liberdade. Ou, pelo menos, com uma maior autonomia do que em geral é entendido!?
Esses Ideogramas eram as formas com que se faziam composições, enfatizando, mais ou menos algumas das ideias que se pretendessem transmitir (por exemplo conforme o número de vezes que essas mesmas imagens iconográficas fossem aplicadas).
É verdade que a maneira como os Estilos são vistos tem vindo a mudar***, no entanto, é provável que ainda haja hoje quem pense o mesmo que o referido autor escreveu? Não percebendo que cada monumento é/foi um texto, em que os seus criadores eram relativamente livres – embora nunca totalmente (em relação a quem encomendou a obra) – para redigir e articular os vocábulos do discurso visual, como muito bem entendessem?
Depois, e considerando que estamos perante uma Iconoteologia, também é verdade que a laicização das sociedades, começou a esgotar o modelo que vigorava desde a Baixa Antiguidade, o Helenismo e o Paleocristão... Deixando de se compreender e conhecer o significado daquilo a que nós chamamos Ideogramas, em composições quw são consideradas Revivalismos!
Só que, para o caso da Basílica da Estrela, como sucede com Monserrate, e com inúmeras outras obras (por exemplo algumas neogóticas estudadas por Regina Anacleto), os críticos, os analistas e os comentadores, tão depressa exigem obras que tivessem sido o equivalente a redacções sem criatividade e monocórdicas. Como se passam para o outro lado, e não entendem as novas sínteses que foram feitas. É então que falam, ou escrevem, sobre anacronismos!
É útil entendermo-nos; que abram as mentes e percebam a importância dos Ideogramas (ou de formas específicas), para os Estilos! Percebam que mesmo um monumento não fica como "Lugar de Memória" do instante. Mas sim do movimento, e da corrente "non stop" que é o tempo: que por sua vez marcou as ideias, e as imagens que as traduziam, e das quais cada monumento é, então, um sinal dessa progressão (e tambem da variabilidade)!
~~~~~~~~~~~~
*Considerando o exemplo que damos (da mentalidade de 1946), percebe-se a exigência. Por essa época, e em vários dos Monumentos Nacionais, a DGEMN levava a cabo inúmeras obras, que deveriam ter sido apenas (ou principalmente) de conservação. Mas que se ocuparam, demasiadamente, fazendo «restauros estilísticos», um pouco à maneira de Viollet-Le-Duc: que chegou a propor que as obras fossem «recolocadas», com mais rigor na «verdade» de cada estilo. As suas palavras não foram exactamente assim, ler (e extrapolar para outros estilos e obras) o que consta em Memória, Propaganda e Poder, sobre “Viollet-Le-Duc e o restauro estilístico”, de Maria João Baptista Neto, FAUP, Porto 2001, p. 41 e seguintes.
**Em A Basílica da Estrela, Livros Horizonte, Lisboa 2008, p. 11. Vindo de A Arte Sacra em Portugal, Armando de Lucena, 1946.
***Se em geral não mudaram, nós mudámos, notando-se que há vários outros - onde captamos as suas ideias mais ricas, embora incompletas - na mesma linha? Em Monserrate, uma nova história, consta, várias vezes, a palavra Ideograma. Ficando esboçada uma nova perspectiva da Cultura Visual. Questão que permanece bem escondida, pois muda as noções dos (actores e agentes) mais conservadores; os relutantes a mudanças que preferem o seu slow motion...
Ver http://iconoteologia.blogs.sapo.pt/