Neste blog e nos posts que escrevemos temos insistido muito na importância das Imagens, na medida em que as mesmas «deram a ver» o pensamento, e constituíram uma Cultura Visual, com base nas duas únicas realidades que os homens da Antiguidade dispunham: a natureza, e a capacidade de pensar. E essa capacidade de pensar, criou «obras», absolutamente extraordinárias (é a nossa opinião), como há dias mostrámos com o exemplo que é o Teorema de Pitágoras: o qual vai muito além das imagens e é matemática. Ou, pela perspectiva contrária (e muito descurada): o Teorema de Pitágoras, mais do que matemática é definição de relações formais.
Mas, para quem como nós está há mais de três décadas no ensino (que entretanto passou a ser designado superior...) e aí tem conhecido «doutores» das áreas das ciências e das engenharias que, por exemplo, não fazem mentalmente, as mais simples das multiplicações (como 12x12, ou 36x4). Ora, em consequência destes péssimos paradigmas que vão aparecendo*, também temos podido perceber, neste grande intervalo de tempo que decorreu desde meados dos anos 70, como tem sido desvalorizado o verdadeiro Saber ou Conhecimento: aquele que admirávamos e ainda admiramos, o único que sempre nos há-de fascinar!
Acontece que muitos dos"novos detentores do conhecimento" (ou «doutores da mula russa»), deixaram de ser as pessoas simples, que ainda conhecemos - imensas, felizmente - e passaram a ser, com uma frequência que é excessiva, pessoas que se tratam com grandes vénias e muitos salamaleques: como verdadeiros actores que chocalham cabeças vazias, ou os bonecos cheios de arames e um pêndulo, que Bordallo Pinheiro inventou e a fábrica continua a produzir. Os"novos detentores do conhecimento" - Conhecimento que por isso fica ao nível das palavras que enchem o título deste post - percebe-se que eles passam umas horas a mirar-se ao espelho, a ensaiar poses e feitios, tal e qual «modelos de passerelle».
Mas enfim, deixemos quieta essa bonecada - que nunca deveria ter saído das prateleiras das feiras - e avancemos sobre o que se está a passar. Como de tanta obra feita à base de «desenrascanso», no qual os portugueses são exímios, e se ufanam disso, se trabalhou e se chegou a conseguir criar uma sociedade, que, está «à rasca»!
Claro que hoje também nos choca, demasiado, o que se passou ontem no Japão. Como um sismo de enorme intensidade tem a capacidade mortifera, e destruidora, que as televisões têm exibido, e que é impossível não impressionar. E é aqui que se encontra tudo: isto é, tudo o que escrevemos nos parágrafos anteriores, incluindo «o fazer do desenrascanso»: a maneira como somos facilitistas (o que é diferente de ser facilitador), e nos deixamos levar por um dia-a-dia em que não nos preocupamos com as questões que são essenciais.
E mais ainda, depois de inúmeros apelos, há instituições que continuam a arrogar-se o direito de não cumprirem as normas e as leis. Estamos a pensar no (antigo e velhinho) RGEU, ainda completamente actual, e em vigor; aquilo que o facilitismo dos fazedores de qualquer coisa, independentemente da sua qualidade, não prezam e desconhecem**:
"Artigo 143.º: As saídas das edificações devem conservar-se permanentemente desimpedidas em toda a sua largura e extensão. É interdito qualquer aproveitamento ou pejamento, mesmo temporário, das saídas, susceptível de afectar a segurança permanente da edificação ou dificultar a evacuação em caso de incêndio."
Claro que poderíamos ir muito mais longe, trazendo para aqui outras normas legislativas, mas limitamo-nos a referir aquelas que aludem à aplicação de normas específicas anti-sismos, que todos os projectistas, como tal, têm que conhecer e fazer cumprir (e que, inclusivamente, justificam acréscimos nos honorários dos trabalhos, conforme a sismicidade da região do país, para a qual o projecto é feito).
Sempre que há sismos violentos é a fragilidade da vida que vem ao de cima! São os valores que prezamos, as normas e os exercícios que cumprimos, ou até a aprendizagem que fazemos das situações limite, e como nos devemos comportar durante as mesmas. Nós portugueses estamos «à rasca», porque admitimos o facilismo permanente, e o sistema de desenrascanso total, em que temos admitido viver. O qual todos os dias é posto em prática, não para ficar bem feito, mas apenas para fazer vista, sem a menor substância!
Hoje aqui não há imagens (bastam as que chegam do Japão, e o que das mesmas nos fica na memória). Que se leiam para dentro, ou vocalizando, os sinais visuais deste texto, mas, tentando pensar no que tem sido, com demasiada frequência, o fingir e o fazer de alguns: o seu único propósito, que é "...épater le bourgeois"!
Como os pais de muitos portugueses - da chamada hoje, tristemente, «geração à rasca» - pessoas que graças à democratização fizeram um salto económico, e sócio-cultural, imenso, e que por isso, julgando estar a dar aos seus filhos o melhor, e aquilo que eles próprios não tiveram, esses pais não conseguem aperceber-se do quanto estão a ser enganados e roubados...
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*Embora felizmente não sejam a regra, mas existem, talvez distribuídos de acordo com as percentagens da Curva de Gauss? O que é gravíssimo, pois não traduzem o melhor da sociedade, ou uma elite que foi seleccionada (isso sim, seria o verdadeiramente excelente): limitam-se, como na Curva de Gauss, a retratá-la e a reproduzi-la, tal e qual é.
**Mas que, como é sabido, legalmente não podem desconhecer, já que a lei tem a inteligência de não contemplar os ignorantes. Muito menos ainda, os ignorantes militantes!
http://musicasportuguesas.blogspot.com/2006/08/desenrascanso-palavra-portuguesa.html
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